terça-feira, 7 de outubro de 2008

Recordar é viver - O Encontro (parte I)

(... Meu passado inteiro...)

Nota do escriba: texto publicado no antigo endereço, em 14/08/2006! Nem lembrava que fazia mais de dois anos!

O Encontro … (Parte I)


Um herói de guerra, sua moto e um momento inesquecível.

Foi um momento mágico. Nunca mais conseguiu lembrar as palavras que disse. Mas ela sorriu um sorriso tão lindo, o olhou com aqueles belos olhos azuis e abaixou a cabeça de uma maneira que David nunca mais conseguiu esquecer. Bem que tentou. Pensava em outras mulheres, outros momentos mas sempre a mesma cena voltava-lhe a memória. Por causa de Giovanna, nunca mais se apaixonou por outra mulher. Para preservar aquele momento, guardou uma moto que fez parte deste encontro. Cuidou como nunca uma pessoa cuidou de um bem, pois era algo valioso, mágico, onde nenhum dinheiro do mundo o faria desfazer dela. Tudo por causa de Giovanna…

Para que vocês saibam o que aconteceu, vamos voltar no tempo, quando David era piloto da Força Aérea Inglesa (a famosa RAF – Real Air Force), na distante e já quase esquecida 2ª Guerra Mundial. Um dos melhores pilotos ingleses de sua época, nutria ódio descomunal pelos italianos, por causa de seu pai - abatido em vôo em combate nos céus da “Vecchia Senora”. Combatia sem medo de viver ou morrer, sobrevivendo combate após combate e abatendo mais e mais adversários.

Quando a guerra terminou no já distante 1945, David não sabia o que fazer e para onde ir. Sentia muito a falta de seu pai, amigo e mentor, além do fato de nunca ter conhecido sua mãe, estava perdido na vida. Canhoto, sofria uma dor chata na mão esquerda que o acompanharia pelo resto de seus dias. Dor vinda dos tempos de colégio, onde as freiras sempre o castigavam por meio de palmatória, por insistir em usar para escrever, uma mão que não era a direita. Esta mesma dor que se transformava em ódio quando ele pilotava seus aviões na guerra, agora o atrapalhava quando pilotava sua segunda paixão, as motos. E ninguém era louco de falar sobre motos italianas para ele, como as Ducatis e Guzzis. Boa só moto inglesa, como as Tryumphs e Vincents, estas últimas sempre preferidas.

Pintou a oportunidade de vir morar no Brasil, incentivado pelo tio Henry que já estabelecera aqui e tinha uma importadora na cidade litorânea de Santos. Como nada nesta vida é por acaso, mal sabia David que esta vinda para terras tupiniquins marcaria sua vida para sempre…

O dinheiro começou a vir fácil, as encomendas dos paulistanos não paravam de chegar e David finalmente pode comprar a moto de seus sonhos. E não era um moto qualquer era uma (claro) Vincent 500, tão inglesa quanto ele e chá das cinco. A mágoa dos italianos já estava praticamente esquecida e sua nova aquisição o ajudara muito nisto. Mas em um belo sábado, quando seu tio o mandou para São Paulo receber de um de seus clientes, dono de uma cantina no bairro do Bexiga, aquela mágoa voltara com tanta intensidade que ele só conseguira falar cerrando os dentes:

“-Um italiano?”, perguntou já com os olhos vermelhos de raiva…

“-É dinheiro, vá buscar!”, respondeu o seu velho tio com a frieza típica dos ingleses.

Esqueceu a maldita dor na canhota, pegou sua moto e deu algumas voltas para clarear pensamentos que voltaram com a força de um furacão à sua cabeça. Precisava relaxar e tentar dormir, pois algo diria que seu Domingo não seria dos mais fáceis…

Amanhece, David pega seu xodó, monta sobre ela e dispara em direção a São Paulo. Acelerar sua possante moto pelas curvas da estrada de Santos (que viraria música na voz de certo cantor anos mais tarde…) era o sonho de qualquer jovem daquela época. Dor na mão, ódio espumando, nada melhor que uma boa tocada para chegar mais tranqüilo no bairro dos “maledetos” italianos. Ficou assim, pensando em curvas, motores, aviões, seu pai até encontrar o endereço do cliente. Quando parou em frente a casa do carcamano, seus problemas começaram… Ela estava saindo, chapéu e sombrinha rendada:

-“Bom giorno…”

Falou abrindo um sorriso como mulher nenhuma jamais sorrira para ele. O jovem David gaguejou, tremeu e sentiu que estava perdido...


CONTINUA…

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